- Aquela é a constelação de Órion, é fácil encontra-la por causa das três estrelas que formam o cinturão. Você pode ver?
A frase fora pronunciada por um rapaz deitado em um gramado. O céu noturno estava limpo, permitindo que as estrelas pudessem ser vistas. Um de seus braços estava estendido apontando a constelação enquanto o outro aninhava a garota deitada em seu peito, que também olhava para o céu.
- Estou vendo sim! Ouvi dizer que Órion era um grande caçador que despertou a ira de uma deusa e, quando morto, os deuses levaram seu corpo para os céus...
Um sorriso amargo formou-se no rosto do jovem, enquanto seu braço envolveu com mais força sua acompanhante, como para não deixá-la se distanciar nem que por alguns centímetros apenas. A mão que estava erguida encostou-se nos cabelos da moça em seus braços e seus dedos começaram a percorrer os fios de leve.
- Sabe de uma coisa, Dan? Eu queria que as estrelas fossem como aquelas que desenhávamos quando crianças: tivessem cinco pontas, fossem fofinhas e gostosas de apertar. Preferencialmente com rostinhos sorridentes e que conversassem conosco! – A garota voltou a falar.
- Li certa vez que as estrelas falam... E apenas aqueles que amam têm o poder de ouvi-las. – Daniel disse com certa provocação no tom de voz.
- É? Então o que elas têm a dizer para mim? – A garota tampou os olhos com as mãos e sorriu em silêncio por alguns instantes. – Ouvi algo sobre Daniel ser o melhor namorado do mundo!
A luz das estrelas foi interrompida pela sombra da garota que se erguia sobre o seu corpo rapidamente para beijá-lo repetidas vezes. Era bom sentir o toque de seus lábios, o calor de sua pele, sua presença... Tinha de concentrar seus pensamentos naquele momento, sem se lembrar de tudo o que viria depois, de todas as provações pelas quais logo passaria. Não queria pensar em mais nada que não fosse o céu estrelado ou a amada em seus braços.
Em um movimento rápido, porém delicado, deitou-a novamente na grama e inclinou-se sobre ela, apenas para vê-la sorrindo tal qual uma criança satisfeita com um brinquedo e a luz das estrelas acima deles refletidas em seus olhos.
- Acho que elas dizem o mesmo a respeito de minha Stella...
Ela sorriu antes de buscar novamente seus lábios, reiniciando a sessão de carinhos interrompida há pouco. Não podia deixar de achar que tinha muita sorte em ser tão feliz! Nunca pudera imaginar que algum dia uma garota que mal saíra do segundo ano de treinamento pudesse namorar um dos rapazes do nono ano... Em todos os treinamentos e principalmente nos intervalos e atividades comuns, suas colegas paqueravam os veteranos como verdadeiro esporte, mas fora a menina tímida e concentrada que conquistara a atenção daquele considerado o mais brilhante aluno de sua turma. Tais fatos ocorreram três anos antes e, desde então, eram um dos casais mais unidos e apaixonados dos quais poderia haver notícias.
- Se alguém da Academia nos pegar aqui a essa hora, estaremos ferrados!
- Não se preocupe, estrelinha. Eles não vão nos pegar, algum dia pegaram? – Daniel disse enquanto acariciava os cabelos da namorada levemente.
- Não parece o melhor aluno do penúltimo ano falando! – Stella disse rindo, repetindo a piada que sempre fazia quando mencionava que poderiam ser encontrados por algum dos superiores e Daniel afirmava que nada aconteceria.
- Sim, sou...
As estrelas dos olhos de Daniel pareceram se apagar quando ele disse tais palavras. Ao invés de rir e falar alguma coisa sobre melhores alunos terem direito a namoradas, como sempre fazia, seu rosto tomou contornos sombrios. A garota, percebendo a mudança, perguntou com o mais sério tom de voz que tinha:
- O que está acontecendo?
Daniel deu um longo suspiro e sentou-se no gramado, acomodando a namorada em seu colo. Disse, olhando para os olhos refletores de estrelas externas e preocupações internas:
- Você sabe o que estamos fazendo aqui? Digo, por que estamos na Academia?
- Estamos estudando para sermos grandes pilotos e comandantes, para que este planeta possa continuar protegido, assim como as pessoas que vivem nele. Sei também que é graças aos esforços da Academia e do monitoramento de órbita que podemos ter o privilégio de ver o céu estrelado da noite porque a paz está mantida. – Stella repetia as palavras ensinadas como mantras por seus professores com um mau pressentimento.
- Lembra do que disse agora pouco sobre desejar que as estrelas fossem palpáveis e fofinhas? – A voz de Daniel ganhava uma entonação nervosa e era com dificuldade que ele dizia tais palavras.
- Sim...
- Eu tenho uma estrela dessas em meus braços agora... Mas terei de me separar dela. – Ao terminar a frase, desviou o olhar e fechou os olhos.
- Se... pa... rar...?
- Tal qual Órion, terei de ir aos céus... Fui escolhido para uma missão perigosa, justamente por ser o melhor aluno de meu ano. Deverei partir para a estação de treinamento orbital amanhã e não sei se haverá um retorno.
Stella quis argumentar que ele ainda não estava no ano de se formar. Que haveria um retorno em breve. Que era tudo uma grande mentira e ele estava dizendo aquilo apenas para desesperá-la. Que não suportaria vê-lo partir. Não conseguiu dizer nada, entretanto; sua única reação foi olhar estática para seu rosto com uma expressão desesperada.
- Sabe muito bem que estamos aqui justamente para isso e corremos o risco de partir quando solicitados.
- Eu sei... – Foi tudo o que ela conseguiu responder. Como gostaria de não saber disso!
- Recebi a notícia hoje de tarde, parece que o serviço de inteligência detectou a proximidade de um ataque e deveremos desestabilizar as bases inimigas antes que este ocorra. Fui chamado por ser considerado brilhante demais... Saberá disso, assim como todos os outros alunos, amanhã pela manhã. Em teoria, era apenas para os alunos do último ano partirem em missão, mas irei com eles.
Daniel apertou a namorada com força entre seus braços, não querendo soltá-la ou dizer coisa alguma naquele momento. Não tinha escolha, era parte de seus deveres como jovem oficial obedecer às ordens mesmo quando estas lhe parecessem desagradáveis ou descabidas. Tinha sido ensinado durante os últimos doze anos o quanto a vida de um era um preço baixo a se pagar pela felicidade de todos e que a segurança do planeta e das pessoas que o habitavam era mais importante do que seus desejos e ambições pessoais. Mas, mais do que nunca, tudo o que queria era mandar a Academia às favas e partir com Stella para uma vida onde não houvesse riscos iminentes ou missões perigosas, mas apenas a paz de sua companhia e o conforto de seus braços, olhos e sorriso.
Todavia, apesar de seus desejos, tinha total consciência de sua responsabilidade e de todos os fatos que decorriam dela. Mesmo a amada também sendo piloto em potencial, estando mais segura nos alojamentos e salas de aula da Academia do que em outro lugar do mundo, sabia que sua missão também serviria para proteger a vida que lhe era mais cara.
- Dan... Daniel... Você está chorando... – Stella disse enquanto passava os dedos de leve pelo rosto do namorado. – Pilotos não podem chorar...
- Futuras oficiais também não... – Daniel disse enquanto limpava as lágrimas da namorada. – Eu vou voltar para você, entendeu? Não interessa quanto tempo leve, eu vou voltar para minha estrela!
O casal abraçou-se com força, unido nas lágrimas e pela dor de uma saudade anunciada. Em silêncio, com apenas o som de alguns soluços que não podiam ser contidos de tempos em tempos, estavam abraçados apenas sentindo o corpo um do outro, sensação única da qual não poderiam mais desfrutar por um longo tempo. Poderia, inclusive, ser aquela a última vez.
- Todas as noites... Ao observar as estrelas... Vou te procurar entre elas... – Stella disse, entre lágrimas.
- E eu vou me lembrar todos os dias da estrela que deixo na terra...
Abraçaram-se novamente em silêncio, aproveitando os últimos momentos antes das luzes do céu se apagarem.
***
Informação extra-textual extra:
Na Academia de Oficiais, os alunos entram com 11 anos e saem com 23. Os que demonstram mais aptidão se tornam pilotos, os outros se tornam outro tipo de oficiais.
Tentei construir um texto um bocadinho diferente dos das outras semanas, espero ter agradado. E só saberei se agradei ou desagradei se receber comentários, ok?
Então... Até terça que vem!
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6 comentários:
Esse está um pouco mais objetivo. Ao invés de se revolver os sentimentos por dentro, deixa-se os diálogos darem conta do recado. É uma variação interessante. :)
Sincero, porém amrgo, mesmo não chafurdando em sentimentos internos ainda demonstra uma carga emocional muito grande. Não que isso seja ruim.
Eu falei proce no msn que estava otimo, e repito: está otimo, adorei...merece ser muito continuado!!!
Gostei muito, os sentimentos estão bem representados nas falas e no ambiente criado. Fica evidente o fato: uma despedida sentida. Entretanto considero interresante que num momento desses onde esta presente uma boa quantidade de "carinho" que fosse dada uma descrição leve de como os dois estavam vestidos: estavam com as roupas da academia, o que poderia estar representando um ponto de inibição no jovem casal, ou estavam com roupas mais descontraidas, o que daria aos jovens uma maior liberdade de expressão e ações.
O texto e um show continue assim.
Abraços João J.
As estrelas.....ah, elas sempre têm algo p/ gente.
Enfim, prefiro acreditar que o Daniel voltou....ou não....daí eu seria malvada!
Adoreeeeiii!!
Bjos da fã número zero!!
Oi!
Então, tá BEM legal o texto, como sempre! Adorei a forma como os dois interagiram e até mesmo o otimismo presente... Achei muito bacana!
Ps: Quando vc vai voltar pro msn, bolinho?
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