quarta-feira, abril 18, 2007

Prelúdio de Sombras

Era uma daquelas noites em que apenas as estrelas salpicavam o céu com seu brilho. A pequena vila acalmava-se com o fim das atividades diárias, fossem elas o trabalho de artesãos e camponeses ou mesmo as funções exercidas pelos sacerdotes no templo. Uma tênue fumaça saía de algumas das chaminés relevando que a última refeição do dia estava sendo preparada e o brilho de alguns lampiões podia ser visto através das janelas, revelando habitantes que ainda se mantinham despertos.

Apesar do momento de descanso diário se aproximar, havia uma agitação na praça central da cidade. Em torno de uma fogueira, algumas crianças olhavam para o homem de idade avançada que olhava para elas fixamente, enquanto andava com passos exagerados e ameaçadores para a direção onde estavam sentadas:

- Podem ver as luzes da fogueira? As chamas que se lançam aos céus, as sombras que dançam pelo chão... Pois é. A luz afasta as sombras, as espanta, porém se não há luz, a tendência delas é tomar tudo aquilo que tocam...

Algumas crianças olhavam assustadas para as sombras assustadoras que se formavam no chão, como se dançassem sobre elas, como se fossem engoli-las. Apenas uma delas as olhava com desdém, como se nada fosse capaz de apavorá-lo ou fazer um mínimo arranhão em sua auto-estima.

- Por que vocês têm medo delas? Elas não podem fazer nada contra nós, são apenas imagens!

O ancião riu da petulância do garoto que se levantava com um sorriso desafiador após dizer a frase.

- Mas as Trevas se aproximam, pequeno Gareth, e você precisará de toda a força que guarda dentro de si para poder sobreviver.

As crianças se entreolhavam apavoradas, enquanto Gareth sussurrava algo como “não tenho medo”, sem perder o sorriso de uma superioridade auto-imposta. O ancião também sorria, admirado por ver como aquele menino, mesmo com dez anos, já tinha uma personalidade tão desafiadora. Não podia esperar menos do Primogênito dos Olhos do Céu, muito menos por ser filho de quem era. Era certo que ele realizaria grandes feitos quando fosse mais velho.

- Mas vocês não precisam ter medo. Se a luz permanecer dentro de vocês, as sombras jamais poderão entrar. Jamais se esqueçam disso.

Os olhos curiosamente de cores diferentes de uma menina começaram a lacrimejar. Estava apavorada, como sempre se apavorava em todas aquelas conversas, tinha medo dos monstros que pudessem devorá-la na escuridão. Todas as noites tinha pesadelos sobre ser abandonada por todos, ter de fugir de monstros maiores e mais fortes do que jamais seria, de desaparecer na escuridão sem fim.

- Não precisa chorar, eu vou proteger você.

Sentiu uma mão delicadamente enxugando suas lágrimas e ao olhar para frente, viu Gareth com um sorriso gentil. Aquele menino tão destemido ousava prestar atenção nela, preocupar-se com seus medos! Podia sentir-se um pouco mais confortável.

Por sua vez, um sorriso melancólico percorria o rosto do ancião. Pobres crianças, mal podiam imaginar os tempos sombrios que estavam por vir...

***

Brincando com Gareth e Aurora.
Vocês ainda ouvirão falar deles.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ótimo texto, espero mais para entender quem são as personagens. ^^

Mariano de Azevedo disse...

Rapaz, se eu pegar esse velhote, vou socá-lo!